Arroz e feijão ajudam a combater a desnutrição infantil

10 Ago

Arroz, feijão, bife, verdura e batata-frita. O prato tido como típico do brasileiro está ajudando a combater a desnutrição infantil na cidade de São Paulo. Isso porque ele faz parte do programa desenvolvido pelo Centro de Recuperação e Educação Nutricional (CREN) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Criado em 1994, o CREN atende, atualmente, cerca de 1,5 mil vítimas da desnutrição na cidade de São Paulo. Em regime de semi-internato são 54 crianças de zero a seis anos. De segunda-feira a sexta-feira elas permanecem no local das 7h30 até às 17h30, onde são tratadas por uma equipe multidisciplinar formada por psicólogas, nutricionistas e pedagogas. Quantidade ideal de proteínas e carboidratos Ali, as crianças são alimentadas com leite, pão com manteiga e fruta no café da manhã, às 10 horas tomam um suco e, cerca de uma hora depois, almoçam arroz, feijão, bife, verdura e batata-frita, com direito à sobremesa. Por volta das 17 horas é servido o jantar que, normalmente, é uma variação do almoço. “Esses alimentos fornecem uma quantidade ideal de proteínas, carboidratos, gorduras, vitaminas e sais minerais”, afirma a psicóloga Gisela Solymos, coordenadora de projetos do CREN. Para as crianças menores de um ano, a alimentação é composta de leite, suco e “papinha”, além da introdução de alguns alimentos sólidos.

Com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estima-se que a desnutrição infantil atinge cerca de 5 milhões de crianças de zero a quatro anos no Brasil. No mundo, de acordo com levantamento feito pela Comissão sobre os Desafios da Nutrição para o Século 21, da Organização das Nações Unidas (ONU), 200 milhões de crianças sofrem de alguma deficiência alimentar. E se nenhuma política efetiva de combate ao problema for adotada, esse número poderá chegar a 1 bilhão. Em casos graves, a criança é 40% mais baixa A falta de alimentação adequada compromete o crescimento (estatura) e o ganho de peso infantil. “A criança desnutrida é menor que as demais e, em casos graves, fica mais de 40% abaixo do peso considerado ideal”, diz Gisela. Nesse ponto, a equipe do CREN tem motivos de sobra para comemorar, porque, com arroz e feijão, algumas crianças alcançaram a estatura prevista para a idade. “Esse é um feito muito mais difícil de se atingir do que o ganho de peso”, conta a coordenadora do CREN. A criança subnutrida fica suscetível a infecções respiratórias (otite, gripe, pneumonia) e à diarréia. Pode ter também o sistema imunológico vulnerável e o desenvolvimento neurológico afetado. “Alguns estudos mostram que isso interfere no rendimento escolar”, diz a pediatra Maria Teresa Fernandes, diretora clínica do CREN.

A faixa etária que requer maior atenção nutricional é de zero a seis anos. E o cuidado deve ser redobrado durante os dois primeiros anos de vida. “Essa fase e o início da adolescência são as de maior crescimento”, explica Maria Teresa. “Os ossos, o sistema nervoso e alguns órgãos ainda estão em formação.” Condição socioeconômica precária O problema da desnutrição se origina, de acordo com as especialistas, nas condições socioeconômicas da população. Nas principais cidades do Estado de São Paulo o índice de crianças desnutridas é de 19%. Nas favelas da capital, o número varia de 30% a 40%. Em países desenvolvidos, como os Estados Unidos, a desnutrição atinge de 3% a 4% da população infantil. “O problema está ligado à falta de dinheiro para comprar comida, mas não é só isso”, afirma Gisela Solymos. De acordo com ela, crianças com carência alimentar vivem, em geral, em locais sem saneamento básico (contribui para a proliferação de doenças que podem afetar a absorção dos alimentos) e com acesso precário aos serviços de saúde. Além disso, há uma família desestruturada por trás. “Pais alcoólatras e drogados são incapazes de cuidar de si mesmos. Imaginem o que fazem quanto à alimentação do filho”, diz Gisela. A pediatra Maria Teresa lembra também que existe desnutrição da própria mulher durante a gravidez (que prejudica o bebê) e desmame precoce. As mães deixam de amamentar os filhos antes dos seis meses e trocam o peito pela mamadeira muito rapidamente. “Acabam usando o leite de vaca como a principal fonte de alimentação até os três anos de idade. Essa falta de diversificação leva à carência nutricional.” Matéria de agosto de 2000