Prazer desconhecido
Para muitas mulheres o orgasmo ainda é um mistério. Sem conhecerem o próprio corpo, elas perseguem um prazer que muitas vezes nem sabem que sentem. Convivendo de perto com essas angústias femininas, a psicóloga e coordenadora do curso de especialização em sexologia humana do Instituto Brasileiro de Medicina de Reabilitação (IBMR), Sandra Baptista, afirma que uma das dúvidas mais freqüentes entre suas pacientes é se o que sentiram durante a relação sexual foi ou não um orgasmo. “Há muitas fantasias e mitos em torno do orgasmo feminino. Na verdade, a busca por esse prazer é muito nova. Até porque a sexualidade da mulher nunca teve importância. Cabia a ela se realizar através do seu parceiro. O seu papel era o de satisfazer o marido sexualmente, ser boa mãe, boa dona-de-casa e ponto final”, afirma. Reforçando a submissão feminina, os homens também não tinham expectativa quanto ao prazer ou ao desempenho da parceira. Para eles, o sexo era algo como uma tarefa doméstica. Uma moça de família não deveria sentir prazer. Você deve estar pensando: mas isso é coisa do passado! Errado. De acordo com a psicóloga, ainda hoje algumas mulheres vivem subjugadas a esses valores inibidores e preconceituosos. “Foram muitos séculos de repressão, que fizeram as mulheres perceberem o sexo como algo sujo, feio, ruim e pecaminoso. Mas felizmente esse modelo já se rompeu para muitas pessoas”, diz. No tempo da vovó No final do século passado, estudos científicos demonstraram que a maioria das mulheres não tinha desejo. Além disso, o orgasmo feminino era visto como patológico, uma doença, uma anomalia. Com tanta pressão, que mulher se arriscaria a ter prazer na cama? Esse cenário começou a mudar com a revolução sexual. A mulher passou a prestar atenção em si mesma. Como incentivo, surgiram vários artigos, livros e pesquisas que afirmavam que o dito "sexo frágil" podia – e devia – ter orgasmo, que também se masturba e tem uma fonte de excitação chamada clitóris. “Tantas mudanças trouxeram um novo dilema para as mulheres. Se antes elas recebiam uma educação rígida, em que não havia espaço para o prazer, de repente elas se deparam com a obrigação de se transformarem em verdadeiras atletas na cama. E por quê? Porque foi dito que o normal é ter orgasmo e anormal é aquela que não tem? Por causa disso, muitas mulheres entraram em crise, pois não tinham base emocional para lidar com esses novos padrões de comportamento”, diz Sandra Baptista. Ditadura do prazer É preciso alcançar o orgasmo a qualquer custo. Essa busca desenfreada pelo prazer transformou-se em pesadelo. Algumas mulheres que sofrem de anorgasmia, ou seja, não conseguem ter orgasmo ou só o têm em determinadas situações, passaram a se considerar inferiores e incapazes. “Essa ditadura do orgasmo distanciou as mulheres do que deveria ser o principal, que é o prazer delas mesmo. Para chegar a essa satisfação é preciso se entregar, se sentir à vontade, não ter medo da reação do outro e nem de ser criticada pelo seu desempenho sexual.” Viver a sexualidade na plenitude é mais fácil do que a maioria imagina. Segundo a psicóloga Sandra Baptista, o primeiro passo é desmistificar o orgasmo. Parar de imaginá-lo como algo complicado e inacessível. “As mulheres têm que perceber que esse papo de desempenho sexual nota dez é no mínimo um corta tesão. Basta ser verdadeira. Não precisa fingir. Quem vive apenas atrás do orgasmo fica ligada na realidade, não relaxa, nem se desliga dos medos e das culpas. Permita-se fantasiar, se delicie com as sensações, saia do ar. Você vai ver que tudo ficará melhor.”